O carcinoma pulmonar é a principal causa de morte relacionada com câncer em todo o mundo. Cerca de 85% dos casos estão relacionados com o tabagismo. Os sintomas podem incluir tosse, desconforto torácico, perda ponderal e, menos comumente, hemoptise; mas muitos pacientes apresentam doença metastática sem nenhum sintoma clínico.
Portanto o diagnóstico é tipicamente feito por radiografia de tórax ou por tomografia computadorizada (TC) e confirmado por biópsia. Dependendo da fase da doença, o tratamento requer cirurgia, quimioterapia e/ou radioterapia. Durante as várias últimas décadas, o prognóstico para um paciente com câncer pulmonar era ruim, com apenas 15% dos pacientes sobrevivendo por > 5 anos a partir do momento do diagnóstico. Em pacientes com estágio IV da doença (metástases), a taxa de sobrevida geral em 5 anos era < 1%. Entretanto, os desfechos melhoraram devido à identificação de certas mutações que podem ser alvo de tratamento.
Epidemiologia
O câncer de pulmão é o segundo mais comum em homens e mulheres no Brasil (sem contar o câncer de pele não melanoma). É o primeiro em todo o mundo desde 1985, tanto em incidência quanto em mortalidade. Cerca de 13% de todos os casos novos de câncer são de pulmão.
Estatística Câncer de Pulmão
São esperados 704 mil casos novos de câncer para o triênio 2023-2025.
No Brasil, segundo fontes do Inca temos uma taxa de 32 mil estimados os casos novos e suas respectivas taxas de incidência pelos modelos de predição tempo-linear ou pela razão de incidência e mortalidade.
O tabagismo e a exposição passiva ao tabaco são importantes fatores de risco para o desenvolvimento de câncer de pulmão.
Etiologia
A causa mais importante do câncer de pulmão, responsável por cerca de 85% dos casos, é:
- Tabagismo
O risco de câncer difere de acordo com a idade, intensidade e duração do tabagismo.
O risco de câncer de pulmão aumenta com a exposição combinada a toxinas e tabagismo. Outros fatores de risco confirmados ou possíveis incluem poluição atmosférica, fumar maconha, exposição a tabagismo passivo e a agentes carcinógenos (p. ex., amianto, radiação, arsênio, cromatos, níquel, éteres clorometílicos, hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, gás mostarda ou emissões de fornos de carvão de coque, cozimento primitivo e locais primitivos de aquecimento). Ainda é necessário determinar o risco de câncer de pulmão associado a sistemas eletrônicos de entrega de nicotina (p. ex., e-cigarros).
O risco de câncer cai após o abandono do hábito de fumar, mas nunca retorna ao estado basal. Cerca de 15 a 20% das pessoas que desenvolvem câncer de pulmão nunca fumaram ou fumaram minimamente.
Se e quanta exposição ao radônio doméstico aumenta o risco de câncer de pulmão é controverso.
Suspeita-se também que a doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), deficiência de alfa1-antitripsina e fibrose pulmonar podem aumentar a suscetibilidade ao câncer de pulmão. As pessoas cujos pulmões são afetados por outras doenças pulmonares (p. ex., tuberculose) têm potencialmente maior risco de câncer de pulmão. Além disso, fumantes ativos que ingerirem suplementos de betacaroteno podem ter maior risco de desenvolver câncer de pulmão.
Fatores genéticos
As células epiteliais respiratórias necessitam de exposição prolongada às substâncias desencadeadoras de câncer e acúmulo de múltiplas mutações genéticas antes de se tornarem neoplásicas (um efeito chamado cancerização de campo).
Em alguns pacientes com câncer de pulmão, as mutações secundárias ou adicionais nos genes que estimulam o crescimento celular (K-ras, MYC) causam anormalidades na sinalização de receptores de fator de crescimento (EGFR, HER2/neu) e inibem a apoptose e podem contribuir para a proliferação descontrolada de células anormais. Além disso, mutações que inibem os genes supressores de tumores (p. ex., p53, APC) podem provocar câncer.
Outras mutações que podem ser responsáveis incluem a translocação EML-4-ALK e as mutações no ROS-1, BRAF e PI3KCA. Genes como esses, que são os principais responsáveis pelo câncer de pulmão, são chamados ativadores de mutação (oncogênicos).
Embora os ativadores de mutação (oncogênicos) possam causar ou contribuir para o câncer de pulmão entre os fumantes, essas mutações são particularmente susceptíveis de serem uma causa de câncer de pulmão entre os não tabagistas. Em 2014, o Cancer Mutation Consortium Lung (LCMC) descobriu mutações de ativação em 64% de 733 cânceres de pulmão entre fumantes e não fumantes (25% das mutações K-ras, 17% das mutações EGFR, 8% das mutações EML-4-ALK e 2% das mutações BRAF ). Relataram-se mutações adicionais e novas terapias que têm por alvo as mutações dos ativadores oncogênicos estão sendo desenvolvidas.
Classificação
O câncer de pulmão é classificado em 2 categorias principais:
- Câncer pulmonar de células pequenas (CPCP), cerca de 15% dos casos
- Câncer pulmonar de células não pequenas (CPCNP), cerca de 85% dos casos
O CPCP é altamente invasivo e ocorre quase sempre em tabagistas. Ele cresce rapidamente e cerca de 80% dos pacientes têm doença metastática no momento do diagnóstico.
O comportamento clínico do CPCNP é mais variável e depende do tipo histológico, mas cerca de 40% dos pacientes terão doença metastática fora do tórax no momento do diagnóstico. Identificaram-se mutações de ativação (oncogênicas) principalmente no adenocarcinoma, embora tenha-se tentado identificar mutações semelhantes no carcinoma de células escamosas.
Sinais e sintomas
Cerca de 25% dos carcinomas pulmonares são assintomáticos, sendo detectados incidentalmente com exames de imagem do tórax. Os sinais e sintomas podem resultar de progressão do tumor local, disseminação regional ou metástases a distância. Síndromes paraneoplásicas e sintomas constitucionais podem ocorrer em qualquer estágio da doença. Embora os sintomas não sejam específicos da classificação ou da histologia do câncer, algumas complicações podem ser mais prováveis em diferentes tipos ( Características do câncer de pulmão).
Tumor local
O tumor local causa tosse e, menos comumente, dispneia em decorrência de obstrução das vias respiratórias, atelectasia pós-obstrutiva ou pneumonia e perda de parênquima devido à disseminação linfangítica. Pode ocorrer febre na vigência de pneumonia pós-obstrutiva. Até metade dos pacientes refere dor torácica localizada ou vaga. A hemoptise é menos comum e a perda sanguínea é mínima, exceto em situações raras em que o tumor corrói uma grande artéria, provocando hemorragia maciça e frequentemente morte por asfixia ou exsanguinação.
Disseminação regional
A disseminação regional pode causar dor torácica pleurítica ou dispneia por derrame pleural, rouquidão decorrente de invasão tumoral do nervo laríngeo recorrente e dispneia e hipoxia em decorrência de paralisia diafragmática pelo comprometimento do nervo frênico.
A síndrome da veia cava superior resulta da compressão ou invasão da veia cava superior e pode desencadear cefaleia ou sensação de “cabeça cheia”, edema facial ou das extremidades superiores, rubor e falta de ar quando na posição supina, veias dilatadas no pescoço, face e tronco superior e rubor facial e no tronco (pletora).
A síndrome de Pancoat ocorre quando tumores apicais, em geral CPCNP (tumor de Pancoast), invadem o plexo braquial, a pleura ou arcos costais, desencadeando dor no ombro ou nas extremidades superiores e fraqueza ou atrofia da mão ipsolateral. A síndrome de Pancoast também pode incluir a síndrome de Horner.
A síndrome de Horner (ptose, miose e anidrose) surge quando há comprometimento da cadeia simpática paravertebral ou do gânglio estrelado cervical.
A disseminação do tumor para o pericárdio pode ser assintomática ou provocar pericardite constritiva ou tamponamento cardíaco. Em casos raros, a compressão esofágica pelo tumor leva à disfagia.
Metástases
As metástases eventualmente provocam sintomas que variam de acordo com a localização. Metástases podem se disseminar para o:
- Fígado, causando dor, saciedade precoce, náuseas e, essencialmente, insuficiência hepática
- Cérebro, causando mudanças comportamentais, confusão mental, afasia, convulsões, paresia ou paralisia, náuseas e vômitos e, por fim, coma e morte
- Ossos, causando dor intensa e fraturas patológicas
- Glândulas adrenais, raramente causando insuficiência adrenal
Síndromes paraneoplásicas
As síndromes paraneoplásicas são sintomas que ocorrem em locais distantes de um tumor ou de suas metástases. As síndromes paraneoplásicas comuns em pacientes com câncer de pulmão incluem:
- Hipercalcemia (em pacientes com carcinoma de células escamosas, que ocorre porque o tumor produz proteína relacionada com o hormônio paratireoideo)
- Síndrome de secreção inapropriada de hormônio antidiurético (SIADH)
- Baqueteamento digital com ou sem osteoartropatia pulmonar hipertrófica
- Hipercoagulabilidade com tromboflebite superficial migratória (síndrome de Trousseau)
- Síndrome semelhante à miastenia (síndrome de Eaton-Lambert)
- Síndrome de Cushing
Várias outras síndromes neurológicas
Outras síndromes neurológicas incluem neuropatias, encefalopatias, encefalites, mielopatias e doenças cerebelares. Os mecanismos das síndromes neuromusculares envolvem a expressão tumoral de autoantígenos, com produção de anticorpos, mas a causa da maioria das outras síndromes é desconhecida.
Diagnóstico:
- Radiografia de tórax
- TC ou PET-TC combinada
- Exame citopatológico do líquido pleural ou do escarro
- Normalmente, biópsia guiada por broncoscopia e biópsia de núcleo
- Às vezes, biópsia de pulmão aberto
Exames de imagem
Raio-x do tórax é muitas vezes o exame de imagem inicial. Ele pode mostrar anormalidades claramente definidas, como uma massa única ou massas multifocais ou um nódulo pulmonar solitário, hilo aumentado, mediastino aumentado, estreitamento traqueobrônquico, atelectasia, infiltrados parenquimatosos que não desaparecem, lesões cavitárias ou espessamento ou derrame pleural inexplicáveis. Esses achados são sugestivos, mas não diagnósticos, de carcinoma pulmonar e exigem o seguimento com tomografia computadorizada de alta resolução (TCAR), TC ou PET-TC combinada e confirmação citopatológica.
TC mostra muitos padrões e aspectos característicos que podem sugerir fortemente o diagnóstico. A TC também orienta a biópsia por agulha do núcleo das lesões acessíveis e é útil para o estadiamento. Se uma lesão encontrada em uma radiografia simples tem alta probabilidade de ser decorrente de câncer de pulmão, pode-se realizar uma PET-TC para ajudar no diagnóstico e estadiamento. Este exame combina imagens anatômicas da TC com imagens funcionais da tomografia com emissão de prótons (PET). As imagens da PET podem ajudar a diferenciar processos inflamatórios e malignos.
Citologia
O método usado para obter células ou tecido para a confirmação depende da acessibilidade do tecido e da localização das lesões suspeitas. A citologia do escarro ou do líquido pleural é o método menos invasivo. Nos pacientes com tosse produtiva, os espécimes do escarro obtidos ao despertar podem conter altas concentrações de células malignas, mas o rendimento deste método é de < 50% como um todo. O líquido pleural é outra fonte conveniente de células; um derrame maligno é sinal de prognóstico ruim e indica doença em estágio avançado.
Em geral, os resultados falso-negativos de citologias podem ser minimizados pela obtenção de grande volume de escarro ou líquido pleural o mais cedo possível no dia, enviando-se os espécimes imediatamente ao laboratório de patologia para minimizar atrasos no processamento porque esses atrasos levam à decomposição celular. Estudos moleculares (genéticos) podem ser feitos em grânulos celulares tumorais embebidos em parafina a partir do líquido pleural se este for centrifugado e o grânulo celular for preservado a tempo.
Procedimentos
A biópsia percutânea é o próximo procedimento menos invasivo. É mais útil para os locais de metástases (linfonodos supraclaviculares ou outros periféricos, pleura, fígado e adrenais) do que para as lesões pulmonares. Os riscos incluem uma probabilidade de 20 a 25% de pneumotórax (principalmente em pacientes com enfisema significativo) e o risco de se obter um resultado falso negativo.
Broncoscopia é o procedimento usado com mais frequência para o diagnóstico de câncer de pulmão. Teoricamente, o procedimento de escolha para a obtenção de tecido é aquele que é menos invasivo; mas, na prática, a broncoscopia é frequentemente realizada em associação ou em substituição a procedimentos menos invasivos, porque os resultados diagnósticos são maiores e porque a broncoscopia é importante para o estadiamento.
A combinação de lavado, escovação e biópsias das lesões endobrônquicas visíveis e de linfonodos paratraqueais, subcarinais, mediastinais e hilares frequentemente fornece o diagnóstico tecidual. Avanços nas técnicas para guiar o broncoscópio melhoraram o resultado diagnóstico e a precisão da amostragem das lesões mais periféricas. Pode-se fazer biópsia endobrônquica guiada por ultrassom (EBUS) durante a broncoscopia e tem um resultado excelente. EBUS é atualmente o método preferido para o estadiamento do mediastino, exceto nos casos em que não é possível obter uma amostra dos linfonodos devido a considerações anatômicas.
A mediastinoscopia é o exame padrão-ouro para avaliar os linfonodos mediastinais, mas é um procedimento de alto risco que normalmente é usado antes da cirurgia torácica para confirmar ou excluir a presença de tumor nos linfonodos mediastinais.
Indica-se a biópsia pulmonar aberta, realizada por meio de toracotomia aberta ou utilizando auxílio de vídeo, quando métodos menos invasivos não propiciarem o diagnóstico de pacientes cujas características clínicas e aspectos radiográficos sugerirem fortemente um tumor passível de ressecção.
Biópsia de núcleo é preferível à biópsia por agulha final porque a segunda obtém muito pouco tecido para estudos genéticos precisos.
Triagem
Acredita-se que a triagem para câncer de pulmão beneficie os pacientes com doença em fase inicial, especialmente CPCNP precoce tratável com resseção cirúrgica e agora é recomendada em populações de alto risco. Um grande estudo demonstrou que a triagem anual utilizando TC helicoidal de baixa dose (TCBD) resultou em uma redução de 20% nas mortes por câncer de pulmão em comparação à triagem com radiografia de tórax. O estudo definiu a população de alto risco como ex-tabagistas ou tabagistas ativos (principalmente 55 a 74 anos) que fumam pelo menos 30 maços de cigarro por ano e, se ex-fumantes, que pararam nos últimos 15 anos. No entanto, o rastreamento com LDCT pode não ser apropriado para pacientes que não são de alto risco.
Fonte: Por Robert L. Keith, MD, Division of Pulmonary Sciences and Critial Care Medicine, Department of Medicine, Eastern Colorado VA Healthcare System, University of Colorado traduzido por Momento Saúde
https://www.inca.gov.br/
Referências
1. National Lung Screening Trial Research Team, Aberle DR, Adams AM, et al: Reduced lung-cancer mortality with low-dose computed tomographic screening. New Engl J Med 365 (5):395–409, 2011. doi: 10.1056/NEJMoa1102873.
2. Moyer VA, US Preventive Services Task ForceUS Screening for lung cancer: U.S. Preventive Services Task Force recommendation statement. Ann Intern Med 160 (5):330–338, 2014. doi: 10.7326/M13-2771.
Referência sobre etiologia
1. Kris MG, Johnson BE, Berry LD, et al: Using multiplexed assays of oncogenic drivers in lung cancers to select targeted drugs. JAMA 311 (19):1998–2006, 2014. doi: 10.1001/jama.2014.3741.