Um Novo Horizonte Para o Tratamento do Alzheimer
A batalha contra a doença de Alzheimer, que por décadas foi marcada pela falta de tratamentos realmente eficazes, acaba de ganhar um aliado poderoso: o Kisunla. Desenvolvido pela farmacêutica americana Eli Lilly, este novo medicamento foi recentemente aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no Brasil, após ser avaliado e aprovado pelo Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos.
A notícia da aprovação do Kisunla representa mais do que um avanço médico; é uma nova esperança para milhares de famílias brasileiras que convivem diariamente com os desafios de uma doença devastadora e progressiva. Afinal, o Alzheimer não afeta apenas quem é diagnosticado, mas também impacta profundamente todos ao redor — filhos, cônjuges e cuidadores.
O Alzheimer é uma condição que compromete a função cerebral de maneira irreversível. Até pouco tempo atrás, os tratamentos disponíveis focavam apenas em amenizar os sintomas, sem alterar significativamente o curso da doença. Kisunla muda essa realidade ao interferir diretamente no processo que leva à degeneração cerebral.
Entendendo o Alzheimer: Da Fisiopatologia à Realidade Clínica
A doença de Alzheimer é causada pelo acúmulo anormal de duas proteínas: beta-amiloide e tau. Essas proteínas formam placas e emaranhados que danificam a comunicação entre os neurônios e levam, gradualmente, à morte celular. Esse processo resulta na deterioração progressiva das funções cognitivas, afetando memória, linguagem, percepção e habilidades motoras.
Alzheimer é responsável por cerca de 60% a 80% dos casos de demência em todo o mundo. No Brasil, estima-se que mais de 1,2 milhão de pessoas convivem com a doença, número que tende a crescer com o envelhecimento da população.
Por muitos anos, o desafio científico foi encontrar uma maneira segura e eficaz de intervir nesse processo de acúmulo de proteínas. Tratamentos anteriores, como donepezila e rivastigmina, eram direcionados ao controle dos sintomas, sem atuar nas causas biológicas subjacentes.
O Que é o Kisunla e Como Ele Atua?
Nos cérebros de quem tem Alzheimer, costuma haver um acúmulo de uma substância chamada beta-amiloide. Essa substância forma placas que atrapalham a comunicação entre os neurônios — as células que fazem nosso cérebro funcionar bem. O Kisunla foi feito para encontrar essas placas e “marcá-las”, como se colocasse um sinal nelas. Com isso, o próprio organismo da pessoa consegue reconhecê-las e se livrar dessas placas.
Esse processo funciona como uma limpeza no cérebro, removendo o que faz mal e permitindo que o cérebro continue funcionando melhor por mais tempo.
Pesquisas grandes e sérias, como o estudo chamado TRAILBLAZER-ALZ 2, mostraram que esse medicamento consegue desacelerar em até 35% o avanço da perda de memória e das habilidades do dia a dia em quem está nas fases iniciais da doença. Isso é um resultado muito importante, já que, até agora, nenhum outro remédio tinha mostrado essa capacidade de realmente mudar o rumo da doença.
Como é Feito o Uso do Kisunla?
Kisunla é administrado por infusão intravenosa em ambiente controlado, como hospitais ou clínicas especializadas. O esquema de tratamento aprovado envolve aplicações mensais, com monitoramento contínuo do paciente para acompanhar a resposta ao medicamento e eventuais efeitos adversos.
A duração do tratamento pode variar, mas os estudos indicam que muitos pacientes atingem níveis satisfatórios de limpeza amiloide em torno de 12 a 18 meses de terapia. Após esse período, o paciente pode ser reavaliado para decidir sobre a continuidade ou interrupção do tratamento, dependendo da resposta clínica e dos exames de controle.
Vale lembrar que o tratamento exige vigilância rigorosa, com realização periódica de ressonâncias magnéticas para monitorar sinais de complicações neurológicas, como o chamado ARIA (anomalias relacionadas ao amiloide, que podem se manifestar como inchaço ou pequenos sangramentos no cérebro).
Indicação do Kisunla: Quem Pode se Beneficiar
É importante destacar que o Kisunla não é indicado para todos os pacientes com Alzheimer. O medicamento é um novo tipo, criado para ajudar pessoas que estão começando a desenvolver o Alzheimer. Ele age de uma forma diferente dos medicamentos mais antigos. Em vez de apenas aliviar os sintomas, o Kisunla atua diretamente no que causa o problema no cérebro.
Ou seja, recomendado para aqueles que apresentam sintomas leves de comprometimento cognitivo e ainda mantêm certo grau de independência nas atividades do dia a dia.
Antes de iniciar o tratamento, é necessário realizar exames específicos, como a tomografia por emissão de pósitrons (PET scan) com traçadores de beta-amiloide, ou exames de líquor, para confirmar a presença dessas placas no cérebro. Isso porque o mecanismo de ação do Kisunla depende diretamente da existência de placas amiloides para ser eficaz.
Portanto, o diagnóstico preciso e a seleção cuidadosa dos pacientes são fundamentais para maximizar os benefícios do tratamento e minimizar os riscos.
Efeitos Colaterais: O Que Observar Durante o Tratamento
Como todo medicamento inovador, o Kisunla não está isento de riscos. Os efeitos colaterais mais relevantes observados durante os estudos clínicos foram relacionados ao ARIA — principalmente edema cerebral (ARIA-E) e micro-hemorragias (ARIA-H).
Embora a maioria dos casos de ARIA tenha sido leve ou moderada e resolvida sem necessidade de intervenção, a possibilidade de efeitos adversos exige acompanhamento rigoroso. Além disso, pacientes podem apresentar sintomas como dores de cabeça, tontura, náuseas e confusão temporária.
Esses riscos, no entanto, são considerados aceitáveis quando comparados aos potenciais benefícios de retardar o avanço do Alzheimer, uma doença que até hoje contava com opções extremamente limitadas.
O Kisunla Já Está Disponível? E Como Armazená-lo?
Com a aprovação pela Anvisa, o Kisunla pode começar a ser comercializado no Brasil em breve pelas farmácias regularizadas, embora a distribuição e inclusão em planos de saúde ainda dependam de processos adicionais, como aprovação de preço pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED).
O medicamento precisa ser mantido sob refrigeração (2°C a 8°C), protegido da luz, e não pode ser congelado. Seu preparo para infusão deve seguir protocolos rigorosos para garantir a estabilidade e eficácia do princípio ativo.
Por ser um tratamento de alto custo e complexo, é provável que inicialmente ele esteja disponível em centros médicos de referência ou clínicas especializadas em neurologia.
Conclusão: Uma Nova Era Para Pacientes e Famílias
A aprovação do Kisunla marca uma nova era na luta contra o Alzheimer. Pela primeira vez, há um tratamento capaz de modificar o curso da doença e oferecer aos pacientes a possibilidade de preservar sua autonomia e qualidade de vida por mais tempo.
Embora não represente a cura, o donanemabe inaugura uma mudança de paradigma no tratamento da demência, colocando ciência e tecnologia a serviço da esperança.
O futuro do Alzheimer ainda exigirá muitas descobertas, mas hoje, com o Kisunla, pacientes e médicos brasileiros ganham uma ferramenta valiosa para enfrentar a doença com mais coragem e menos resignação.