O diabetes mellitus caracteriza-se pela alteração da secreção de insulina e graus variáveis de resistência periférica à insulina, causando hiperglicemia.
Os sintomas iniciais são relacionados à hiperglicemia e incluem polidipsia, polifagia, poliúria e visão ofuscada.
Portanto pode ocorrer complicações tardias incluem doença vascular, neuropatia periférica, neuropatia e predisposição a infecções.
Já o diagnóstico se faz pela medida da glicemia. O tratamento consiste em dieta, atividade física e fármacos que reduzem os níveis de glicose, como insulina, fármacos anti-hiperglicemiantes orais e fármacos injetáveis não insulina. Complicações podem ser adiadas ou prevenidas com controle glicêmico adequado; doença cardíaca continua a ser a principal causa de mortalidade no diabetes mellitus.
Categorias principais de diabetes mellitus
Mas há duas categorias principais de diabetes mellitus:
- Tipo 1
- Tipo 2
Entretanto pode-se diferenciar os dois tipos de diabetes por uma combinação de características. Os termos que descrevem a idade de início (juvenil ou adulto) ou o tipo de tratamento (dependente de insulina ou não dependente de insulina) não são mais usados por causa da sobreposição das faixas etárias e tratamentos entre os tipos da doença.
Regulação prejudicada da glicose (comprometimento da tolerância à glicose, ou glicose em jejum prejudicada é um estado intermediário, possivelmente de transição, entre o metabolismo normal da glicose e o diabetes mellitus que se torna mais comum com o envelhecimento. É um fator de risco significativo para o diabetes mellitus e pode estar presente por vários anos antes do início do distúrbio. Está associado a maior risco de doenças cardiovasculares, mas as complicações microvasculares diabéticas típicas não são muito comuns (ocorre albuminúria e/ou retinopatia em 6 a 10% dos casos).
Complicações
Portanto anos de hiperglicemia mal controlada provocam complicações vasculares primárias múltiplas que afetam pequenos vasos (microvasculares) e/ou grandes vasos (macrovasculares).
A doença microvascular é subjacente às 3 manifestações mais comuns e devastadoras do diabetes mellitus:
- Retinopatia
- Nefropatia
- Neuropatia
Já a doença microvascular também pode alterar a cicatrização da pele; assim, mesmo pequenas rupturas na integridade da pele podem evoluir para úlceras profundas e se infectar facilmente, sobretudo nos membros inferiores. O controle intensivo da glicemia pode prevenir ou postergar várias dessas complicações, mas não consegue revertê-las se já tiverem se estabelecido.
Doença macrovascular envolve a aterosclerose dos grandes vasos, que pode levar a:
- Angina de peito e infarto agudo do miocárdio
- Episódios isquêmicos transitórios e acidentes vasculares cerebrais
- Doença arterial periférica
A disfunção imunitária é outra complicação significativa, que se desenvolve a partir de efeito direto de hiperglicemia sobre a imunidade celular. Pacientes com diabetes mellitus são particularmente suscetíveis às infecções bacterianas e fúngicas.
Etiologia do diabetes mellitus
Diabetes tipo 1
- Ausência da produção de insulina por destruição autoimune das células beta das ilhotas pancreáticas
No diabetes mellitus tipo 1 (anteriormente chamado de início juvenil ou dependente de insulina), não ocorre produção de insulina em decorrência da destruição autoimune das células beta das ilhotas pancreáticas, possivelmente deflagrada por exposição ambiental de pessoas geneticamente suscetíveis. A destruição evolui de forma subclínica ao longo de meses ou anos, até que a massa de células beta diminua a ponto de as concentrações de insulina não serem mais adequadas para controlar a glicemia.
O diabetes mellitus tipo 1 geralmente se desenvolve em crianças ou adolescentes e até recentemente era a forma mais comum de diagnóstico antes dos 30 anos de idade; entretanto, também pode ocorrer em adultos (diabetes autoimune latente da idade adulta, que muitas vezes se parece com o diabetes mellitus tipo 2). Alguns casos de diabetes tipo 1, não parecem ser de natureza autoimune e são considerados idiopáticos. O diabetes tipo 1 constitui < 10% de todos os casos de diabetes mellitus.
A patogênese da destruição autoimune das células beta ocorre por interações ainda não completamente compreendidas entre genes de suscetibilidade, os autoantígenos e os fatores ambientais.
Os genes de suscetibilidade são os que pertencem ao complexo principal de histocompatibilidade (MHC) — em especial HLA-DR3, DQB1*0201 e HLA-DR4, DQB1*0302, identificados em > 90% dos pacientes com diabetes mellitus tipo 1 — e os que não pertencem ao CPH, que parecem regular a produção e o processamento da insulina e conferem risco de diabetes mellitus associado aos genes do CPH. Os genes de suscetibilidade são mais comuns em algumas populações que em outras, o que explica prevalências mais elevadas de diabetes mellitus tipo 1 em alguns grupos étnicos (escandinavos, sardos).
Os autoantígenos são a descarboxilase do ácido glutâmico, a insulina, a proinsulina, a proteína associada ao insulinoma, o transportador de zinco ZnT8 e outras proteínas das células beta. Acredita-se que essas proteínas sejam expostas ou liberadas durante a renovação normal das células beta ou na lesão das células beta (p. ex., por infecção), ativando primariamente uma resposta imunitária mediada por células T resultando na destruição das células beta (insulite). As células alfa secretoras de glucagon não são atingidas. Os anticorpos aos autoantígenos, que podem ser detectados no plasma, parecem ser a resposta (e não a causa) à destruição das células beta.
Vários vírus (incluindo coxsackie, rubéola, citomegalovírus, Epstein-Barr e retrovírus) foram ligados ao início de diabetes mellitus tipo 1. Os vírus podem infectar e destruir diretamente as células beta ou causar destruição indireta das células beta pela exposição a autoantígenos, ativando linfócitos autorreativos, mimetizando sequências moleculares de autoantígenos que estimulam a resposta imunitária (mimetismo molecular) ou por outros mecanismos.
A dieta também pode contribuir. A exposição de lactentes a derivados lácteos (especialmente ao leite de vaca e à proteína do leite, a beta-caseína), água muito rica em nitratos e baixo consumo de vitamina D foi relacionada com maior risco de diabetes mellitus tipo 1. A exposição precoce (< 4 meses) ou posterior (> 7 meses) a glúten e cereais aumenta a produção de autoanticorpos das células das ilhotas. Os mecanismos dessas associações não estão claros.
Diabetes tipo 2
- Resistência à insulina
Portanto no diabetes mellitus tipo 2 (antigamente chamado de diabetes do adulto ou não dependente de insulina), a secreção de insulina é inadequada porque os pacientes apresentam resistência à insulina. Resistência hepática à insulina leva à incapacidade de suprimir a produção de glicose hepática, e a resistência periférica à insulina prejudica a captação da glicose periférica. Essa combinação dá origem à hiperglicemia pós-prandial e em jejum. Frequentemente, os níveis de insulina são muito altos especialmente no início da doença. Mais tarde durante o curso da doença, a produção de insulina cai, exacerbando ainda mais a hiperglicemia.
Já a doença geralmente se desenvolve em adultos e se torna mais comum com a idade; até um terço dos adultos com mais de 65 anos têm tolerância prejudicada à glicose. Em adultos mais velhos, os níveis de glicose no plasma aumentam ainda mais depois de comer do que em adultos mais jovens, especialmente após refeições com cargas elevadas de carboidratos. Os níveis de glicose também demoram mais tempo para voltar ao normal, em parte por causa do maior acúmulo de gordura visceral/abdominal e massa muscular diminuída.
O diabetes mellitus tipo 2 está se tornando cada vez mais comum nas crianças à medida que a obesidade infantil se tornou epidêmica. Mais de 90% dos adultos com diabetes mellitus têm o tipo 2. Há determinantes genéticos claros, como evidenciado pela alta prevalência da doença em pessoas com ascendência africana, indo-americana, hispânica, nativa do Alasca e asiática americana e em parentes das pessoas com a doença. Embora polimorfismos genéticos gerais tenham sido detectados, não foram identificados genes responsáveis pelas formas mais comuns do diabetes mellitus tipo 2.
A patogênese é complexa e não foi completamente compreendida. Ocorre hiperglicemia quando a secreção de insulina é insuficiente para compensar a resistência à insulina. Embora a resistência à insulina seja característica em pessoas com diabetes tipo 2 e naquelas em risco de desenvolver diabetes, também existem evidências de disfunção das células beta e secreção prejudicada de insulina que progride com o tempo, incluindo
- Primeira fase prejudicada de secreção de insulina
- Perda do caráter normalmente pulsátil da secreção de insulina
- Aumento na sinalização da secreção de pró-insulina, indicando um processamento de insulina prejudicado
- Acúmulo de polipeptídeo amiloide das ilhotas pancreáticas (uma proteína normalmente secretada com a insulina)
A própria hiperglicemia pode alterar a secreção de insulina, pois as altas concentrações de glicose podem dessensibilizar as células beta e/ou causar disfunção das células beta (toxicidade à glicose).
A obesidade e o ganho de peso são determinantes significativos da resistência à insulina no diabetes mellitus tipo 2. Possuem alguns determinantes genéticos, mas também refletem a dieta, os exercícios e o estilo de vida. A incapacidade de suprimir a lipolise no tecido adiposo aumenta as concentrações plasmáticas de ácidos graxos livres, que podem alterar o transporte de insulina estimulado por glicose e atividade da glicogênio sintase muscular. O tecido adiposo também funciona como órgão endócrino, liberando vários fatores (adipocitocinas) que influenciam o metabolismo da glicose de modo favorável (adiponectina) ou adverso (fator de necrose tumoral-alfa, interleucina-6, leptina e resistina).
O retardo de crescimento intrauterino e o baixo peso ao nascimento também foram associados à resistência à insulina mais tarde na vida e podem refletir influências ambientais pré-natais adversas sobre o metabolismo de glicose.
Tipos de diabetes de causas diversas
Vários tipos de diabetes mellitus são responsáveis por uma pequena proporção dos casos. As causas incluem
- Diabetes monogênico decorrente de defeitos genéticos que afetam a função das células beta, ação da insulina ou DNA mitocondrial (p. ex., diabetes de maturidade com início na juventude, diabetes neonatal)
- Doenças que afetam o pâncreas (p. ex., fibrose cística, pancreatite, hemocromatose, pancreatectomia)
- Endocrinopatias (p. ex., síndrome de Cushing, acromegalia)
- Fármacos, mais notavelmente glicocorticoides, betabloqueadores, inibidores de protease, antipsicóticos atípicos, inibidores do checkpoint imunitário e inibidores de calcineurina
A gestação causa alguma resistência à insulina em todas as mulheres, mas apenas algumas evoluem para o diabetes gestacional.
Sinais e sintomas do diabetes mellitus
Os sinais e sintomas mais comum do diabetes mellitus são os da hiperglicemia. A hiperglicemia leve do diabetes precoce é muitas vezes assintomática; portanto, o diagnóstico pode ser adiado por muitos anos se a triagem de rotina não é feita.
A hiperglicemia mais significativa causa glicosúria e, assim, diurese osmótica, levando a aumento da frequência urinária, poliúria e polidipsia que pode evoluir para hipotensão ortostática e desidratação. A desidratação grave causa fraqueza, fadiga e alteração do estado mental. Os sintomas podem surgir e desaparecer com a flutuação dos níveis de glicose.
Polifagia pode acompanhar os sintomas de hiperglicemia, mas não costuma ser a principal preocupação do paciente. A hiperglicemia também pode causar perda ponderal, náuseas e vômitos e embaçamento da visão, além de predispor a infecções por bactérias ou fungos.
Os pacientes com diabetes mellitus tipo 1 tipicamente apresentam hiperglicemia sintomática e, algumas vezes, cetoacidose diabética (CAD). Alguns pacientes apresentam uma fase longa, porém transitória, de glicemias quase normais após o início agudo da doença (fase da lua de mel), pela recuperação parcial da secreção de insulina.
Pacientes com diabetes mellitus tipo 2 podem apresentar hiperglicemia sintomática, mas geralmente são assintomáticos e sua condição só é detectada durante exames de rotina. Em alguns pacientes, os sintomas iniciais são os de complicações diabéticas, sugerindo que a doença estava presente há muito tempo. Alguns pacientes têm inicialmente um estado hiperglicêmico hiperrosolmar, em especial durante um período de estresse ou quando o metabolismo da glicose está ainda mais alterado por fármacos, como os corticoides.
Diagnóstico do diabetes mellitus
- Glicemia (FPG) em jejum
- Hemoglobina glicosilada (HbA1C)
- Algumas vezes, teste oral de tolerância à glicose
O diabetes mellitus é indicado pelos sinais e sintomas típicos e confirmado pela dosagem da glicemia (1, 2). Costuma ser detectada em triagens.
Portanto é melhor a medição após jejum de 8 a 12 horas (FPG) ou 2 horas após a ingestão de solução concentrada de glicose [teste oral de tolerância à glicose (TOTG)] . O teste de tolerância à glicose oral é mais sensível para o diagnóstico de diabetes mellitus e alteração de tolerância, mas menos conveniente e reprodutível que a glicemia de jejum. Assim, raramente é utilizado de rotina, exceto para o diagnóstico do diabetes gestacional e para fins de pesquisa.
Já na prática, o diabetes mellitus ou o comprometimento da regulação da glicemia de jejum costumam ser diagnosticados por meio de dosagens aleatórias da glicemia ou da hemoglobina glicosilada (HbA1C). Um valor aleatória de glicose > 200 mg/dL (> 11,1 mmol/L) pode ser diagnóstico, mas esses valores podem ser modificados por alimentação recente e devem ser confirmados pela repetição do exame; a realização do exame duas vezes pode não ser necessária se houver sinais e sintomas do diabetes.
A HbA1C é uma forma de hemoglobina quimicamente ligada a um açúcar que aumenta à medida que a glicose no sangue aumenta e tem uma relação validada com o nível médio de glicose nos últimos 3 meses. Atualmente, as medidas de HbA1C são incluídas nos critérios diagnósticos para diabetes mellitus:
- HbA1C ≥ 6,5% = diabetes mellitus
- HbA1C entre 5,7 e 6,4% = pré-diabetes ou com risco de diabetes mellitus
Entretanto, a HbA1C é uma medida indireta da glicemia; os valores podem ser falsamente altos ou baixos e podem variar de acordo com a raça/etnia. Os exames devem ser realizados em um laboratório clínico certificado e padronizado para análise de referência. As medições de HbA1C à beira do leito não devem ser utilizadas para fins diagnósticos, embora possam ser usadas para monitorar o controle do DM.
Mas as medidas de glicose na urina, anteriormente de uso comum, não são mais empregadas para diagnóstico ou monitoramento em razão de não serem sensíveis nem específicas.
Triagem para diabetes mellitus
Deve-se fazer triagem para diabetes mellitus em pessoas com maior risco da doença.
Mas os Indivíduos com alto risco de diabetes mellitus tipo 1 (p. ex., irmãos e filhos de indivíduos com diabetes mellitus tipo 1) podem ser examinados quanto à presença de anticorpos de células das ilhotas ou antidescarboxilase do ácido glutâmico, que precedem o início da doença clínica. Entretanto, não há estratégias de prevenção comprovadas para indivíduos de alto risco e, assim, a triagem costuma ser reservada a ambientes de pesquisa.
Os fatores de risco para o diabetes tipo 2 são:
- Idade ≥ 35 anos
- Sobrepeso ou obesidade
- Estilo de vida sedentário
- História familiar de diabetes mellitus tipo 2
- História de comprometimento da regulação da glicose (pré-diabetes)
- Diabetes mellitus gestacional ou parto de lactente > 4,1 kg
- Hipertensão
- Dislipidemia
- História de doença cardiovascular
- Síndrome do ovário policístico
- Raça ou etnia africana, hispânica, asiática-americana ou indo-americana
- Doença hepática gordurosa
- Infecção pelo HIV
Entretanto deve-se fazer a triagem em pessoas ≥ 35 anos e todos os adultos com os fatores adicionais de risco descritos acima a presença de diabetes mellitus por meio do nível de FPG, HbA1c ou TOTG de 75 g em 2 horas pelo menos uma vez a cada 3 anos, desde que as medições plasmáticas de glicose estejam normais e, pelo menos uma vez por ano, se os resultados revelarem alterações das concentrações da glicose em jejum.
Triagem para complicações do diabetes
Portanto todos os pacientes com diabetes mellitus tipo 1 devem iniciar o rastreamento das complicações do diabetes 5 anos depois do diagnóstico. Para pacientes com diabetes mellitus tipo 2, a triagem inicia-se na ocasião do diagnóstico. A triagem típica de complicações é feita:
- Exame dos pés
- Exame fundoscópico
- Dosagem de albumina urinária
- Medição de creatinina sérica e perfil lipídico
Mas fazer o exame exame dos pés pelo menos uma vez por ano para avaliar o comprometimento da sensibilidade a pressão, vibração, dor ou temperatura, que caracterizam a neuropatia periférica. Testa-se melhor a sensibilidade à pressão com estesiômetro de monofilamento. Deve-se examinar todo o pé, em especial a pele sob os metatarsos, em relação a rachaduras e sinais de isquemia, como ulcerações, gangrena, infecções de unha por fungos, diminuição de pulsos e perda de pelos.
Um oftalmologista deve fazer o exame de fundo de olho; o intervalo de rastreamento é tipicamente anual para os pacientes com algum tipo de retinopatia e a cada 2 anos para aqueles sem retinopatia no exame anterior. Se houver progressão da retinopatia, pode ser necessária uma avaliação mais frequente.
Portanto fazer exame de urina matinal ou de 24 hora para detectar albuminúria, e dosar a creatinina sérica anualmente para avaliar a função renal.
Vários médicos consideram ECG básico importante dado o risco de doenças cardíacas. O perfil lipídico deve ser verificado pelo menos uma vez por ano e com maior frequência se houver anormalidades. Aferir a pressão arterial em todos os exames físicos.