A leucemia linfocítica crônica é o tipo mais comum de leucemia no mundo ocidental. O risco médio ao longo da vida de LLC em ambos os sexos é cerca de 0,57% (1 em 175 brasileiros).
Embora a causa da LLC seja desconhecida, alguns casos parecem ter um componente hereditário. A LLC é rara no Japão e na China, e a incidência não parece aumentar entre os japoneses expatriados nos Estados Unidos, sugerindo a importância dos fatores genéticos. A LLC é mais comum entre descendentes de judeus do leste europeu.
Fisiopatologia
Na leucemia linfocítica crônica, os linfócitos B CD5+ sofrem transformação maligna. Os linfócitos B são continuamente ativados pela aquisição de mutações que levam à linfocitose de linfócitos B monoclonais (LBM).
O acúmulo adicional de anomalias genéticas e subsequente transformação oncogênica dos linfócitos B monoclonais levam à LLC. Os linfócitos inicialmente se acumulam na medula óssea e então se disseminam para os linfonodos e outros tecidos linfoides, com o tempo induzindo à esplenomegalia, hepatomegalia e sintomas sistêmicos como fadiga, febre, sudorese noturna, saciedade precoce e perda ponderal não intencional.
Com o progresso da doença, a hematopoese anormal resulta em anemia, neutropenia, trombocitopenia e diminuição da produção de imunoglobulina. A hipogamaglobulinemia pode se desenvolver em até dois terços dos pacientes, aumentando o risco de complicações infecciosas. Os pacientes têm maior suscetibilidade a anemias hemolíticas autoimunes (com um teste de antiglobulina direto positivo) e trombocitopenia autoimune.
A LLC pode evoluir para leucemia prolinfocítica de linfócitos B e pode se transformar em linfoma não Hodgkin de grau mais alto. Cerca de 2 a 10% dos casos de LLC se transformam em linfoma difuso de grandes células B (chamado de transformação de Richter).
Sinais e sintomas
Os pacientes são geralmente assintomáticos a princípio, com início insidioso de sintomas não específicos (p. ex., fadiga, fraqueza, anorexia, perda ponderal, febre e/o suores noturnos), que podem requerer a avaliação.
Mais de 50% dos pacientes apresentam linfadenopatia. A linfadenopatia pode ser localizada (com linfonodos cervicais e supraclaviculares sendo os mais comumente envolvidos) ou generalizada. Esplenomegalia e hepatomegalia são menos comuns do que linfadenopatia. O envolvimento da pele (leucemia cutânea) é raro.
Diagnóstico
- Hemograma completo e esfregaço periférico
- Citometria de fluxo do sangue periférico
- Imunofenotipagem
A primeira suspeita de leucemia linfocítica crônica ocorre quando se encontra uma linfocitose periférica absoluta de > 5000/mcL.
A Citometria de fluxo do sangue periférico pode confirmar a clonalidade dos linfócitos B circulantes. Os linfócitos circulantes devem expressar cadeias leves de CD5, CD19, CD20, CD23 e kappa ou lambda. Diagnosticam-se os pacientes com linfocitose B monoclonal em caso de contagem absoluta de linfócitos < 5000/mcL, mas com evidências de clonalidade.
Cerca de 1 a 2% dos casos de linfocitose B monoclonal evoluem para LLC a cada ano . Aspirado e biópsia da medula óssea não são necessários para o diagnóstico da LLC. Mas se feitos, a medula óssea frequentemente demonstra > 30% de linfócitos.
Outros achados no diagnóstico podem incluir hipogamaglobulinemia (< 15% dos casos) e desidrogenase láctica (DHL) elevada, níveis elevados de ácido úrico, enzimas hepáticas e, raramente, hipercalcemia. Exames citogenéticos e moleculares realizados com sangue periférico no momento do diagnóstico ajudam a determinar o prognóstico.
A classificação usa os sistemas de estadiamento de Rai ou Binet. Nenhum dos sistemas prediz efetivamente a progressão precoce da doença. Não se recomendam exames de imagem de rotina para o estadiamento inicial.
Prognóstico
O histórico natural da leucemia linfocítica crônica é altamente variável. A sobrevida varia de 2 a 20 anos, com uma taxa média de 10 anos. Pacientes no estagio 0 a II de Rai podem sobreviver por 5 a 20 anos sem tratamento.
Outras características prognósticas da LCC incluem:
- Tempo de duplicação de linfócitos
- Anomalias genéticas específicas
O tempo de duplicação de linfócitos é o número de meses que leva para a contagem absoluta de linfócitos duplicar. Pacientes não tratados com tempo de duplicação de linfócitos < 12 meses têm um curso clínico mais agressivo.
Anomalias citogenéticas de alto risco específicas incluem del (17p) e del (11q). Outras características prognósticas adversas incluem um gene da região variável da cadeia pesada de imunoglobulina não mutado, presença de CD38 na citometria de fluxo e expressão de ZAP-70.
Tratamento
- Quimioimunoterapia, terapia direcionada e, às vezes, radioterapia
- Cuidados de suporte
Considera-se leucemia linfocítica crônica incurável de acordo com o padrão atual de tratamento; o tratamento visa melhorar os sintomas. Portanto, adia-se o tratamento até que os pacientes tenham um dos seguintes:
- Sintomas atribuídos à LLC
- Linfocitose progressiva com aumento de ≥ 50% ao longo de um período de 2 meses
- Tempo de duplicação de linfócitos inferior a 6 meses
Os sinais e sintomas que indicam tratamento imediato em pacientes com LLC são:
- Sinais e sintomas constitucionais (febre, sudorese noturna, fadiga extrema e perda ponderal)
- Hepatomegalia significativa, esplenomegalia ou linfadenopatia
- Infecções recorrentes
- Anemia e/ou trombocitopenia sintomática.
- Quimioimunoterapia
- Terapia direcionada
- Radioterapia
Tratamento de suporte:
- A transfusão de hemácias para anemia.
- Transfusões de plaquetas para sangramento associado com trombocitopenia
- Antimicrobianos para infecções bacterianas, fúngicas ou virais
Como a neutropenia e a hipogamaglobulinemia limitam a morte bacteriana, a terapia com antibióticos deve ser bactericida. Deve-se considerar infusões de gamaglobulina para o tratamento de paciente com hipogamaglobulinemia e infecções refratárias ou para profilaxia quando ≥ 2 infecções graves ocorrerem em até 6 meses.
Terapia inicial
A quimioimunoterapia visa:
- Aliviar os sintomas
- Induzir remissões duráveis
- Prolongar a sobrevida
Não existe um regime padrão de quimioimunoterapia. A seleção da terapia inicial depende das características do paciente, características específicas da doença como presença de del (17p) e objetivos abrangentes da terapia.
Análogos da purina (p. ex., fludarabina), bem como agentes alquilantes (bendamustina, Clorambucila e
ciclofosfamida) foram utilizados em combinação com um anticorpo monoclonal anti-CD20, o rituximabe. Pacientes não tratados que são capazes de tolerar a quimioterapia costumam receber a combinação de fludarabina, ciclofosfamida e rituximabe. Como alternativa, os pacientes idosos não tratados em geral recebem bendamustina e rituximabe, porque esse regime é mais fácil de tolerar .
A LLC com del (17p) é frequentemente refratária à quimioimunoterapia, mas o ibrutinibe demonstrou melhorar o desfecho. O ibrutinibe é um novo inibidor oral da tirosina quinase de Bruton (Btk), uma enzima essencial para a ativação de várias vias que aumentam a sobrevida das células na LLC. Estudos comparando o ibrutinibe em regime de monoterapia com o ibrutinibe associado à quimioimunoterapia estão em andamento.
Em pacientes idosos com doenças comórbidas, adiciona-se obinutuzumabe, um anticorpo monoclonal anti-CD20, ao clorambucil. O alvo do obinutuzumabe é a mesma proteína de superfície das células da LLC que o rituximabe. Descobriu-se recentemente que obinutuzumabe mais clorambucil é superior ao rituximabe mais clorambucil para prolongar a sobrevida livre de progressão da doença e alcançar uma resposta completa .
LLC recidivada ou refratária
Deve-se confirmar a LLC recidivada ou refratária histologicamente antes de reiniciar o tratamento. Deve-se excluir especificamente a transformação em linfoma de grandes células (transformação de Richter). Monitoram-se atentamente os pacientes assintomáticos com LLC recorrente a procura de sintomas que justifiquem tratamento.
Os fatores que influenciam a escolha do tratamento na recidiva incluem:
- Terapia inicial utilizada
- Duração inicial da resposta
O ibrutinibe (um inibidor de Btk) pode melhorar a taxa de resposta e a sobrevida livre de progressão na LLC recidivada ou refratária. O ibrutinibe é mantido até que desenvolva-se toxicidade ou a doença progrida.
Portanto outras terapias alvo eficazes para a LLC recidivada incluíam idelalisibe [um inibidor oral da fosfoinositida 3′-quinase (PI3K) delta] e venetoclax (um inibidor oral de Bcl-2). Pode-se usar venetoclax em pacientes com del (17p) que receberam pelo menos uma terapia anterior.
A monoterapia com um anticorpo monoclonal anti-CD20 (rituximabe, ofatumumabe, obinutuzumabe) pode aliviar transitoriamente os sintomas.
Considerar o transplante alogênico de células-tronco hematopoiéticas para os pacientes que são aptos.
Radioterapia
Pode-se administrar irradiação paliativa a áreas de linfadenopatia ou para envolvimento do fígado e baço que não responde à quimioterapia. A irradiação total do corpo em doses pequenas é às vezes bem-sucedida para melhor temporariamente os sintomas.
Referências sobre o tratamento
1. Eichhorst B, Fink AM, Bahlo J et al: First-line chemoimmunotherapy with bendamustine and rituximab versus fludarabine, cyclophosphamide, and rituximab in patients with advanced chronic lymphocytic leukaemia (CLL10): an international, open-label, randomised, phase 3, non-inferiority trial. Lancet Oncol 17:928–942, 2016.
2. Goede V, Fischer K, Busch R, et al: Obinutuzumab plus chlorambucil in patients with CLL and coexisting conditions. New Engl J Med 370:1101–1111, 2014.
Traduzido por Momento Saúde